segunda-feira, 25 de novembro de 2013

culturaafrobrasileira / poemas africanos

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Navios Negreiros




Navio Negreiro

Cerca de 115 frases e pensamentos: navio negreiro

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.


 

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

terça-feira, 5 de novembro de 2013

A Sala de leitura como meio de aprendizado


Sala de leitura como leitura do ensino

Jefferson André de Jesus Corredor 

 

Em geral, as salas de leitura configuram-se como um lugar muito específico: acima de tudo, são locais onde são guardados livros e outros materiais impressos destinados a alunos, professores, funcionários e membros da comunidade. E esse é um dos aspectos que podem prevalecer no uso que a instituição escolar faz delas.

A limitação, muitas vezes comum, ao cumprimento dessa função básica reflete a manutenção e a administração dessas salas. A ausência de uma OSL (Orientadora da Sala de Leitura) que possua projetos relacionados à leitura é também um problema que compromete toda a potencialidade desse espaço.

Diante da falta de uma proposta direcionada à leitura, por exemplo, para as séries iniciais do Ensino Fundamental, todo um conjunto de livros que poderiam ser disponibilizados aos alunos acaba sendo subutilizados. Digo subutilizados não como julgamento de quem sabe como seria o “jeito certo” de se utilizar um livro, mas como conseqüência do raciocínio de que ler um livro vai além de tê-lo diante de si e reconhecer as letras e as imagens ali impressas.

É necessário refletir com mais propriedade sobre que tipo de leitura será proposta pela escola e como o devemos desenvolvê-la junto aos alunos.

Seja pelo próprio processo que originou o projeto de salas de leitura, seja pela dinâmica da política de ensino da unidade escolar, o que ocorre freqüentemente é que esse espaço físico chamado sala de leitura propicia geralmente aos alunos experiências intermitentes, vagas, se não quase nulas, com relação à leitura vista como processo dialógico, que ao mesmo tempo pede um conhecimento sobre o nosso estar no mundo e uma formulação sobre a construção que a escrita nos apresenta.

Isso porque, na escola, a prática da leitura, apesar do discurso oficial dos órgãos de educação apontarem o contrário[1], está muito relacionada à ressignificação da linguagem escrita na oral[2]: a base de uma atividade que poderíamos chamar de leitura disciplinada, cujo melhor exemplo se dá nas leituras em sala de aula, mas também nas de leitura.

Aliás, nota-se muita semelhança entre esses dois ambientes, não apenas nas práticas que teoricamente visam a exercitar a capacidade de leitura dos alunos. A primeira seria suas denominações, que já apontariam para a especificidade dos espaços e para a continuidade entre os dois: uma complementaridade da última em relação à primeira. A segunda estaria na estruturação física dos ambientes. Outras semelhanças seriam encontradas em relação à hierarquia e à atmosfera formal que esclarecem que nas duas salas existe um objetivo que os alunos têm de atingir. Alunos que não terminam a tarefa não podem escolher seus livros, os indisciplinados são privados das aulas na sala de leitura; e, assim, a leitura disciplinada condena ainda mais aqueles que possivelmente já estão excluídos da simples experiência com o objeto livro, porque freqüentemente eles não querem, ou não tentam ler (!). Ou seja, ambiguamente a leitura nas escola é tida como direito e dever.

As atividades da sala de leitura não escapam de outra sina das práticas de leitura na sala de aula. De fato, elas podem mesmo ser um mero complemento à alfabetização; a leitura, então, se limitaria ao reconhecimento da linguagem escrita, o que, a priori, não envolveria uma verdadeira troca entre texto e leitor. Ao invés de propor que os alunos indaguem a realidade a partir do texto, pede-se comumente que leiam frases facilitadas, nas quais as relações entre as sílabas sejam mais destacadas do que a ligação do enunciado à enunciação. Colabora-se assim, de uma forma ou de outra, para a alfabetização, seja lá de que tipo, mas não para sua leiturização.

A idéia de leiturização, proposta por Jean Foucambert (1994), confere à leitura uma importância dialógica que vai além das exigências fundamentais da alfabetização, como as que se apresentam na experiência escolar, de modo geral. Segundo ele, os pressupostos, arraigados na prática escolar, da correspondência irrestrita entre o oral e o escrito podem conduzir a prática da leitura à simples decifração. Essa operação, na qual compete ao leitor reconhecer os escritos e ressignificá-los é chamada por Foucambert de oralização. Para ele, a oralização é

"a atividade que permite constituir uma cadeia oral a partir do escrito. Na pedagogia da leitura, essa oralização supostamente permite atribuir sentido ao que ainda não tem. É fácil mostrar que isso é muito improvável. Três palavras como ‘retém', ‘balbuciam', ‘quociente' só podem ser oralizadas depois de reconhecidas e compreendidas. Esse recurso à oralização para atribuir sentido a uma palavra nunca vista, no adulto (e na criança, se nós não insistíssemos que ela o usasse) é a última de uma série de estratégias; e, na verdade, nunca é utilizada, por ser incerta demais"[3].

Com efeito, a leitura feita na sala de leitura tem freqüentemente mais de tarefa alfabetizadora do que de prática formadora de leitores aptos a desenvolverem estratégias de compreensão de texto. E a condição dos alunos – como alfabetizandos – não justifica absolutamente essa limitação da leitura, pois mesmo uma primeira instrumentalização quanto ao suporte livro, que possui suas peculiaridades, não é desenvolvida de modo satisfatório. Se o fosse, talvez situações ambíguas como a que foi citada acima fossem evitadas. O mesmo se dá em relação à ilustração, algo que nos livros infantis geralmente acompanha a narrativa e cuja “leitura” traz muito do aspecto interativo da leiturização. Como figuração da narrativa, as ilustrações se prestam bem à função de índices textuais, explorando uma linguagem muito significativa: a visual.

Ou seja, precisamente esse ponto, o da compreensão do texto, que tantas e tantas pesquisas têm apontado como um dos fracassos do nosso sistema educacional, é trabalhado nas salas de leitura, mas de modo insuficiente, devido a essa face da “leitura disciplinada”: a alfabetizadora.

Haveria, então, uma íntima ligação entre um modelo alfabetizador e o tipo de leitura promovido pela instituição escola. Mas, conforme discutiremos a seguir, há outra vertente da leitura disciplinada que merece discussão.

Para Foucambert,

Ler significa ser questionado pelo mundo e por si mesmo, significa que certas respostas podem ser encontradas na escrita, significa poder ter acesso a essa escrita, significa construir uma resposta que integra partes das novas informações ao que já se é[4].

Partindo dessa perspectiva, a famigerada prática de “tomar a leitura” enfoca apenas um aspecto da leitura, o mais básico, de um dos modos que mais poderiam prejudicar o surgimento do gosto por ela: a cobrança por um significado já dado, que deve apenas ser constatado pelo aluno e apresentado à avaliação do professor.

Talvez, um contraponto a essa concepção alfabetizadora da leitura, tão preocupada com o significante seja a prática da leitura que veicula o ler ao exercício da imaginação. Assim, se na primeira a decodificação dos signos lingüísticos é o centro da atenção, na última, é a capacidade da leitura de proporcionar à subjetividade dos alunos um mundo fantasioso que lhes seria familiar.

Por isso, os contos de fadas ou textos que exploram a temática da fantasia são tidos, muitas vezes, como alternativas à “leitura mecânica”. O repertório desse gênero tem sua história intimamente ligada à escola, como prova a compilação (e principalmente o fato de serem adaptações) de Perrault aos contos populares tradicionais.

É dessa forma que a leitura prazerosa é quase sinônimo de “leitura lúdica”:

A conquista do leitor acontece sobretudo no espírito de liberdade, da aventura e do lúdico[5].
Diante das muitas atrações que solicitam às crianças hoje, torna-se necessário que o ambiente escolar – sobretudo a sala de aula – seja um lugar desejável, prazeroso. Por isso, estou convicta da não pertinência de confundir o trabalho de literatura infantil com a cobrança formal e mecânica do texto literário lido pelo aluno , pois essa prática poderia matar todo incentivo à leitura, à percepção da beleza e do encantamento da obra literária, com a conseqüente perda de seus ricos aspectos formativos[6]. (grifo meu)

Entretanto, retomando a idéia de Foucambert da leitura como leiturização, poderíamos também formular que o que soa como um contraponto não seria antes um complemento da leitura entendida como decodificação dos signos lingüísticos.

É nos horários semanais de sala de leitura – onde, como diz o título do livro comemorativo dos trinta anos do projeto, é o lugar do encantamento[7] – que se teria a oportunidade de explorar essa leitura e, através dela, resgatar muito da experiência dos alunos. Todavia, a atividade de leitura que contempla a “imaginação” invariavelmente tende a ser diametralmente oposta àquela que visa ao questionamento. Embora em ambas seja necessário que os alunos retomem dados de suas experiências e vinculem a elas novas informações, a maneira de as duas encararem o mundo costuma ser particularmente diferente.

Um exemplo disso foi a atividade de “leitura simultânea” observada na sala de leitura, na qual a OSL distribuía exemplares da mesma estória para grupos de quatro ou cinco alunos. A primeira estória, “A bota do bode”, foi lida, ou melhor, oralizada.

Na segunda estória, sobre uma avó que saiu para comprar um presente para seu neto, portanto um enredo que teoricamente traria mais da realidade cotidiana, nada foi comentado sobre todo o universo que envolvia a narrativa, ou a significação que ela poderia ter para aqueles que a liam. Por exemplo, onde se vai para comprarmos tais e tais artigos? Como isso se faz? Onde a avó conseguiu dinheiro para comprar o presente? Em que condições vivem nossas avós?

O conceito, divulgado de modo um pouco romântico, de que a leitura é o veículo do imaginário, não tem obrigatoriamente que se furtar ao indagar; ao contrário, se se entende que é indispensável ter prazer com a leitura, imagino que o prazer de que se fala não seja o do leitor ao saber que B+A seja BA, ou o de encontrar na frase “o galo deu a bota ao rato” uma construção insólita, mas sim o prazer que se pode ter quando o que se lê tem algum significado para quem o lê, significado este proposto, testado, comprovado ou simplesmente inferido por ele. Pois, ao sugerir textos “lúdicos”, muitas vezes negligenciam-se outros tipos, que exigem um posicionamento especifico por parte do docente (no caso, o OLS), como aqueles destacados por Foucambert:

A escola deve ajudar a criança a se tornar leitor dos textos que circulam no social e não limitá-la à leitura de um texto pedagógico, destinado apenas a ensiná-la a ler. Então, é preciso conhecer esses escritos sociais! A formação dos docentes deve priorizar o conhecimento sobre os escritos utilizados pelas crianças, bem como a observação das estratégias que as crianças utilizam, quer diante dos programas de televisão, dos textos da rua, da publicidade, quer diante dos jornais, as histórias em quadrinhos, dos manuais de instrução, dos documentários, dos álbuns, da ficção, etc... Deve-se almejar, pelo menos, uma formação comparável à dos bibliotecários especializados em publicações para a juventude, sem mencionar sua permanente atualização[8].

 

Notas

[1] “Trata-se então de trazer para dentro da escola a escrita e a leitura que acontecem fora dela. Trata-se de incorporar, na rotina escolar, a leitura feita com diferentes propósitos e a escrita produzida com diferentes fins comunicativos para leitores reais. Enfim, trata-se de propor que a versão de leitura e de escrita presente na escola seja a mais próxima possível da versão social e que, assim, nossos alunos sejam verdadeiros leitores e escritores”. In: “As práticas sociais de leitura e de escrita na escola”. Projeto Toda Força ao Primeiro Ano, vol. 2, p. 10.

[2] FOUCAMBERT, Jean. A leitura em questão. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.

[3] FOUCAMBERT, Jean. Op. Cit., p. 8.

[4] FOUCAMBERT, Jean. Op. Cit., p. 5.

[5] OLIVEIRA, Maria Alexandre de. Leitura Prazer: interação participativa da criança com a literatura infantil na escola. São Paulo: Paulinas, 1996, p. 25.

[6] Idem ibdem, p. 29.

[7] A esse respeito: “Projeto Salas de Leitura – A rede municipal tem ampla e consciente experiência com as Salas de Leitura, iniciadas em 1972. Hoje são 449 Salas de Leitura em escolas de Ensino Fundamental e Médio, 270 em escolas de Educação Infantil, sendo que nas Salas de Leitura das Escolas de Ensino Fundamental contamos com mais de dois Professores Orientadores de Sala de Leitura em cada Unidade, que são verdadeiros elos entre o mundo mágico e encantado da literatura e todas as comunidades escolares”. In: http://portaleducação.prefeitura.sp.gov.br (Projeto Círculo de Leituras).

[8] FOUCAMBERT, Jean. Op. Cit., p. 10.